terça-feira, 14 de agosto de 2012

Polêmica do art. 1859


Art. 1859
“Extingue-se em cinco anos o direito de impugnar a validade do testamento, contado o prazo da data de seu registro.”

. Não se pode questionar a validade do testamento em vida do testador. O testamento é negócio jurídico mortis causa. Somente com a abertura da sucessão é que a alegada invalidade do testamento pode ser apresentada.

. Este artigo estabelece prazo de caducidade, portanto, prazo de decadência (art. 207 e s.), para que seja impugnada a validade do testamento.

. Como a lei não distingue, não cabe ao intérprete distinguir: o prazo de caducidade se aplica tanto ao caso de nulidade como anulabilidade. A invalidade é o gênero, que comporta as duas espécies (arts. 166 e 171), e não deve ser confundida com a revogação (arts. 1969 a 1972), a caducidade (art. 1971) e o rompimento do testamento (arts. 1973 a 1975).

. Tratando-se de testamento nulo, o dispositivo abre exceção ao principio da teoria geral do negocio jurídico, de que a nulidade não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo (art. 169). Mesmo que eivado de nulidade, o testamento não pode mais ser atacado se a ação não for apresentada em cinco anos, contado o prazo do registro do testamento.

. Lembre-se do que disse em sala: O registro do testamento, que determina o termo inicial para contagem do quinquênio, dá-se, é claro, após a morte do testador, com a apresentação do testamento ao juiz e cumpridos os requistos legais (CPC, arts. 1.126, 1.128, 1.133 e 1.134).

. Adiante, no art. 1909, o Código afirma que são anuláveis as disposições testamentarias inquinadas de erro, dolo, coação, e o parágrafo único desse artigo prevê: “Extingue-se em quatro anos o direito de anular a disposição, contados de quando o interessado tiver conhecimento do vicio”.

. Como se vê, o prazo para que a ação seja interposta, no caso de anulabilidade da disposição testamentária, é elástico, não tem termo inicial rígido, certo e, embora possa servir melhor ao interesse puramente individual, não convém à sociedade, pois introduz um fator de insegurança jurídica. O testamento é negocio jurídico mortis causa, que tem eficácia quando o seu autor já não mais esta presente. Manter a possibilidade de questionar e atacar uma disposição, por vício de vontade que teria sofrido o testador, e isso por um tempo variável, indeterminado, tornando instável e vacilante o processo de transmissão hereditária, com certeza, não é de melhor política legislativa.

. Pode ocorrer, inclusive, em muitos casos, que o prazo para anular a mera disposição testamentária – portanto, para anular parcialmente o testamento – seja maior, e muito maior do que o prazo para arguir a anulação ou para declarar a nulidade do testamento inteiro. A nulidade pode ser total ou parcial, fulminar todo o testamento, ou parte dele, ocorrendo o mesmo com a anulabilidade (art. 184). Pode ser nula, ou anulável, apenas uma clausula somente uma disposição do testamento.

. Como esta posto, a anulação da disposição testamentária, cuja ação é cabível a partir do momento em que o interessado tiver conhecimento do vício, pode ocorrer num prazo variável, algumas vezes extremamente longo, ocorrendo, eventualmente, muito depois da própria execução da disposição testamentária. Isso gera instabilidade, e não é bom. Um testamento nulo, p. ex., não pode mais ter a validade impugnada depois de cinco anos do seu registro. Mas uma disposição que ele contém, sob argumento de que o testador errou, deliberou mediante dolo, ou foi vitima de coação, pode ser anulada muito depois daquele prazo, pois a decadência do direito de atacar a disposição começa a ser contada de “quando o interessado tiver conhecimento do vício”.

. A solução não é lógica, não é razoável. O tema carece de reforma, precisa ser ordenado, sistematicamente.

(Com base em Zeno Veloso.)

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